Quem me conhece, sabe que eu conheço muita gente e tenho muita história para contar. Quem me conhece melhor ainda, sabe que EU tenho um monte de histórias para contar. São coisas que vi, vivi e ouvi dizer. Eu gosto de histórias. História do Brasil, do mundo, mas das pessoas. Gosto mais do que de estórias. Acho que esta é a minha verdadeira coleção, de histórias reais, de pessoas reais, que vira e mexe eu ponho uma vírgula aqui e outra acolá para dar um quê a mais.
Estes dias estava pensando que a primeira história que tive não pude presenciar. Mas por ironia era sobre mim. Felizmente, meu pai estava lá. Meu pai é outro bom contador de histórias, que gosta de colecionar os causos do povo que viu, do povo que vê. E ele me contou, que lá pros idos de 1981, mais precisamente no dia 20 de junho, nasceu uma menina.
Minha mãe conta que achou o melhor nome para esta menina na Capricho, anos antes, numa fotonovela. Desde que ela viu Ivy nas páginas da revista, decidiu que assim que eu nascesse, este seria meu nome. Quando ela engravidou, mamãe tinha uma banca de jogo de bicho no bairro da Lapa. Acho que o jogo de bicho está um tanto quanto demode e convém explicar que é um tipo de loteria em que as pessoas apostam num número que corresponde a um bicho. 11 é burro, 9 é vaca e 24… bem, todos sabem o que é 24.
Na banca, ela tinha várias clientes assíduas. Uma delas, acho que era a Adelaide, disse que Ivy era um nome bonito, mas sem impacto. E que como aquela criança que ali estava um dia seria famosa, precisava de um nome famoso. E escolheu Cristina, assim sem mais nem menos, só porque combinava com o Ivy.
Quando minha mãe viu minha carinha pela primeira vez, achou que Adelaide estava certa: eu tinha cara mesmo de Ivy Cristina! Por isso, ela e papai foram ao cartório da Lapa para, vamos assim dizer, formalizar meu nome.
Chegaram lá. Até hoje não entendi porque os atendentes de cartório costumam ser mal humorados. O da Lapa, papai contou, era muito, mas muito mal humorado mesmo. Chegou o casal comigo, um bebê de poucos dias no braço. E como todo casal com um bebê quer registrar o neném, ele foi pegar o livro e perguntou:
-Como é o nome da criança?
-Ivy Cristina.
O cartorário ficou em silêncio por dois segundos. Folheou um grande livro e respondeu:
-Não pode.
Minha mãe, atônita, perguntou:
-Como assim não pode?
-Ivy não está no livro.
-Que livro?
-Este livro.
Minha mãe não pensou nem um segundo. Muito cínica – ela é extremamente cínica – perguntou:
-E Brigida, pode?
Meu pai tremeu. Ali vinha uma boa. Brigida era o nome dela. Mas como ela estava muito calma, ele não se desesperou. O cartorário consultou o livro e disse:
-Brigida também não pode, não tem no livro.
Mais cínica ainda, ela respondeu:
-Jura? Que interessante. Você poderia então me fazer um favor?
-Claro.
-Por gentileza, seu filho da puta, rasgue esta merda porque eu me chamo Brigida. Vamos, acabe com o meu RG.
Completamente sem graça pela resposta e pelo riso geral que provocou no cartório (os presentes não se conformaram com a cara dele), ele abriu o livro, datilografou as letras e firmou que era verdade e ainda dava fé que aquele bebê era sim, Ivy Cristina.
Confesso que sempre gostei de Ivy, mas nunca fui muito chegada no Cristina. Quando vinha um “Ivy Cristina” era porque a coisa estava feia. Foi estes dias que vi que a (por que não dizer) petulância de mamãe, foi fundamental para ser quem eu sou. Por causa de um merdinha de um escrivão, eu poderia ter sido qualquer coisa, menos Ivy Cristina. E o que sempre gostei do meu nome é porque ele é único (nunca conhecei uma Ivy, muito menos uma Ivy Cristina). E isso marcou a minha personalidade.
Se minha mãe não fosse gaiata, provavelmente eu teria sido Camila, Ana Paula, Carolina, Maria. Nada contra nenhuma destas meninas com estes nomes, é que tem muitas destas por ai. E se não fosse por mamãe, provavelmente eu teria sido como a Hivína, que na maternidade era apenas Hivna, um nome russo. O irmão de Hivína, Saulo, me contou que o “cara do cartório não deixou que fosse só Hivna, tinha que ter o ‘i’ e o acento”.
Ou poderia ter sido como o Illan Co. O avô dele era Cohen, nome importante na tradição judaica, que significa “sacerdote”. Por um erro do cartório, o pai dele(e logo ele e o resto dos decendentes) passaram a ser simplesmente Co. Ou como o Nelson Saccho, que tem os primos, os avós e todos os familiares como Sacco. Tudo porque o cartorário errou.
Ou poderia ser como a Laeyza, já que o cartorário obrigou sua mãe a colocar um “y” e um “z”. Ou mesmo como a filha do ministro, já que o cartorário achava que “Preta” não era nome, era cor. Gil, muito esperto, disse que se Rosa e Branca eram nomes (e cores), a filha dele poderia ser Preta sim. Mas o cartorário só deixou depois de por um nome de santa. E a tal da Preta, que era para ser apenas Preta, virou Preta Maria Gil.
Acho incrível alguém não se dar conta que o nome, coisa mais básica e importante de um cidadão, um dos seus mais valiosos bens, esteja errado. E ainda não fazer nada para corrigir. Acredito que por ai devam existir muitas Camilas, Ana Paulas, Carolinas e toda a sorte de Marias porque o cartorário simplesmente não deixou que fossem outra coisa. Ou errou.
Me pergunto: quem o cartorário pensa que é para dizer umas coisas destas? E quem somos nós que permitimos, que não o fazemos checar e reescrever? Ou ainda alteramos no próprio cartório (a PUC serve para alguma coisa e o professor de direito civil me ensinou que até os 18 anos podemos fazer tudo isso sem advogados no próprio cartório)?
Tudo isso parece absurdo. E realmente é. Mas infelizmente, acontece. Hoje vejo que a ousadia de mamãe foi única neste País de cidadãos passivos. Vejo ainda que cada dia que passa, é mais necessária, não só no cartório, como nas urnas, nos fóruns, nos semáforos, em cada esquina por ai. E penso que deve ter sido um dia memorável aquele dia. Não para mim ou para minha família. Esta vai lembrar para sempre. Mas para a lição que aquele cartorário da Lapa levou. Acho que ele, mais do que ninguém, deve ter pensado duas vezes antes de abrir aquele livro de nomes “oficiais”. Talvez ele nem se lembre de mim ou do meu nome, mas certamente nunca se esqueceu do dia em que eu me tornei Ivy Cristina.
quarta-feira, 30 de setembro de 2009
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5 comentários:
Ivy, que coincidência.... Nem sei por onde começar....é mehor começar pelo começo né? rs. Há anos atrás, nem me lembro quantos (hj estou com 52), li uma fotonovela onde o nome da personagem era IVY e adorei o nome, principalmente pela resposta que a atriz dá qdo. seu par romantico perguntou seu nome. Ela respondeu: "Ivy, não é nenhuma maraviha mas pelo menos tem a vantagem de ser curto" (Talvez a sua mãe tb se lembre dessa fala)rs. Daí eu disse a mim mesma: "quando eu tiver uma filha ela vai se chamar "Ivy". Os anos se passaram, minha vida tomou vários rumos e acabou que tive uma fiha linda, mas que por forças das circuntâncias, resolvi homenagear uma tia muito amada e a "Ivy" não nasceu de mim, e sim a Luísa. Porém, uma amiga muito íntima, daquelas que é mais irmã do que simples amiga, que sabia da minha história com "Ivy", tb engavidou e me pediu para dar este nome à menina. Claro que adorei a idéia e assim foi feito. Ontem mesmo estava conversando com a Ivy (hj com 21 anos, estudande de medicina em Ouro Preto-MG) e ela me perguntou sobre a história do seu nome. Aí eu contei que vi numa fotonovela da Capricho, etc, etc, etc.... e hj entrei na net para tentar encontrar esta revista e comprar pra ela, qdo. encontrei seu blog, li sua história e adorei a coincidência. Ah, a Ivy daqui, é Ivy Carolina. Bonito nome tb né?
Será que um dia encontraremos esta revista para comprar. Seria tão legal se vcs lessem esta fotonovela. Acho que o ator era Andrea Giordano... E o nome da fotonovela, será que sua mãe se lembra? Se tiverem alguma novidade, por favor, façãm contato com nilmahelena@gmail.com. Abraços!
Oi Ivy, sabe como te conheci (ou ainda não)?? Através da minha mãe. Uma mulher de fibra como a sua, que me deu um nome lindo: Ivy Caroline. Você a entrevistou e irá entrevistar hoje novamente, chama-se Jismalia, um nome peculiar também, que se fosse registrado aqui em São Paulo talvez não existisse, mas foi na Bahia e lá todos os nomes podem. Alias nem todos deveriam poder rs! Incrível a sua estória, o meu nome também tem uma, mas como é longa vou contar somente o fim. Meu nome era para ser Yvi, por escolha da minha mãe, na verdade acho até mais bonito, mas meu pai quando foi me registrar quis contrariá-la e inverteu. Hoje sou Ivy! Naquela época algumas mulheres achavam que nome duplo era chique, então para completar virei Ivy Caroline. Hoje sou tudo, menos chique rs! Agora você conhece outras meninas que são especias só por ter esse nome lindo. Fico por aqui. Um abraço. (ivy_c28@hotmail.com)
Oi Ivy, sabe como te conheci (ou ainda não)?? Através da minha mãe, uma mulher de fibra como a sua, que me deu um nome lindo: Ivy Caroline. Você a entrevistou e irá entrevistar hoje novamente, chama-se Jismalia, um nome peculiar também, que se fosse registrado aqui em São Paulo talvez não existisse, mas foi na Bahia e lá tudo pode. Alias nem todos deveriam poder rs! Incrível a sua estória, o meu nome também tem, mas como é longa vou contar somente o fim. Meu nome era para ser Yvi, por escolha da minha mãe, na verdade acho até é mais bonito, mas meu pai quando foi me registrar quis contraria-la e inverteu. Hoje sou Ivy! Naquela época algumas mulheres achavam que nome duplo era chique, então para completar virei Ivy Caroline. Hoje sou tudo, menos chique rs! Agora você conhece outras meninas que são especias so por ter esse nome lindo. Fico por aqui. Um abraço. (ivy_c28@hotmail.com)
Oi também me chamo Ivy Cristina, pois a minha tia tbm leu a mesma fotonovela e adorou o nome e disse que iria colocar na filha dela quando ela tivesse mais minha mãe engravidou primeiro e colocou o nome em mim, ao contrario de vc eu gostava mais do Cristina mais hoje em dia eu prefiro Ivy tem mais personalidade....
Olá!
Por coincidência temos um nome inspirado de uma mesma fotonovela, percebi que somos do mesmo ano e mês rsrsrsrs...
Adoro meu nome, mas a grafia do meu é: Ivi Joyce, meus pais também tiveram problema no cartório para registrarem-me. Felizmente foi apenas na questão do “Y”, devido o Joyce já ter o “Y” não deixaram colocar o “Y” no Ivi rsrsrs... minha mãe ficou uma “fera” quando meu pai chegou em casa e relatou que a famosa Senhora Neli Seeba a dona do Cartório de Rubiataba não autorizou colocar Ivi com “Y”. Fiquei muito emocionada ao ler sua história, pois, também tenho uma mãe valente, e sobretudo sobre a poética das escolhas de nossos nomes.
Gostaria muito de encontrar a fotonovela que deu origem ao meu nome, se tiver algo que possa ajudar-me ficarei muito grata... Abraços de Ivi para Ivy...Rsrsrsrs
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