quarta-feira, 30 de abril de 2008

Manual do Brasileiro

O ruim de ir para Suíça é ver a vida pode ser diferente. E o diferente para gente é normal para eles. Explico: na Suíça não tem flanelinhas, menino fazendo malabarismo no sinal, favelas e nem trânsito caótico. E tem ainda tulipas nos canteiros (e ninguém pega), ônibus decente e no horário, etc. Não estou comparando os países ou dizendo que um é melhor que o outro, apenas diferente. E quando eu chego no Brasil, me surpreendo com estas coisas, assim como quando chego na Suíça me surpreendo com as coisas de lá. 

Por isso, é com surpresa que eu me deparo novamente com situações bem brasileiras. Meu telefone ficou 20 desligado. Chego no Brasil e ligo o aparelho. Uma hora depois o telefone toca: é a operadora da Vivo. 

"Bom dia senhora Ivy Cristina, meu nome é Patrícia e sou vendedora da Vivo."
"Obrigada, mas não estou interessada. Tenho um bom dia."

Como eu acho totalmente indelicado desligar o telefone na cara de uma pessoa, mesmo sendo ela uma operadora chata que nem carrapato da Vivo, esperei ela dizer goodbye.

"Mas a senhora não quer nem ouvir nossa proposta?"
"Não, muito obrigada, tenho um bom dia."

Como acho totalmente indelicado desligar o telefone na cara da pessoa, mesmo ela merecendo como aquela atendente merecia, não desliguei. E ela continuou.

"Olha, não estou interessada na sua proposta. Eu agradeço sua atenção, mas enquanto você fala, estou pagando caro, porque estou fora da cidade."
"Mas com a Vivo a senhora não paga os minutos no roaming."

Como eu acho totalmente indelicado desligar o telefone na cara dos outros, resolvi apelar e usar um truque ensinado pela minha prima Gina.

"Eu não quero um celular da Vivo porque eu já tenho um."
"E é pré-pago ou pós pago?".

Essa menina era brasileira, ela não desiste nunca. Falei mais uma vez que não estava interessada e desliguei, sumariamente. 

Foi pensando nesta e em outras situações que passei recentemente na terra do Brasil, que pensei que tem situações que só existem no Brasil- e temos que saber lidar com elas. Então já que existe manual para ser mãe, arquiteto, bom de cama, pensei em fazer um manual, o Manual do Brasileiro. Aí pensei mais um pouco e vi que não, não podia ser um Manual do Brasileiro, porque eu teria que ensinar como ser brasileiro. E isso os brasileiros já sabem. Eu teria era que escrever um Manual de Como Viver no Brasil. O público alvo seriam os gringos, claro. Mas serviria perfeitamente aos brasileiros, porque eu pediria que minha querida amiga Gloria Kallil fizesse um adendo de Como Viver no Brasil com elegância. 

O manual teria dicas de como lidar com operadores de telemarketing como a Patrícia. E teria dicas de como não perder a paciência tentando ser educado (é, eu perdi a minha). As outras situações possíveis seriam no sinal de trânsito, na Duana, na Caixa Econômica, no SAC (ou PoupaTempo, como preferir). Ensinaria a como lidar com vizinhos folgados (é, também não existe isso na Suíça, aliás nunca vi vizinhos pidões como os nossos em lugar nenhum do mundo) e toda a sorte de infortúnios que só podem mesmo acontecer no Brasil. 





segunda-feira, 28 de abril de 2008

Oceano

Sou que nem Vasco, Lisboa é meu porto. A TAP me leva e me tira a alegria, mas agradeço a Santos Dummont pela graça atendida. 


Eu odeio aeroportos. Não como odeio shopping center, que é um ódio derivado da raiva, de não gostar daquela multidão que os lota todos sábados à tarde. Eu odeio aeroportos pelas lembranças que eles têm da minha vida. Dois, deles, melhor dizendo: o de Guarulhos, com aquele nada mais que nada em volta, e o de Salvador, este sim, com um lindo bambuzal e com uma das frases que me norteiam: "Adeus, não. Até breve". Aeroporto significa o adeus, o longe, o ver de novo sabe-se lá quando. Significa ficar longe do pai ou da mãe. 

A vida inteira aeroporto foi isso para mim e achava que as lágrimas que nesses lugares eu costumava derrubar já eram passado. Estava enganada, a gente nunca se acostuma com a dor e as saudades. E nos dias em que ela se torna tão visível quanto nos das despedidas em aeroportos, fica insuportável. 

Aeroporto significa separação, mas também reencontro. Mas a alegria deste é incomparável a dor do primeiro porque na separação o prazo é indeterminado, no reencontro é diluída aos poucos. 

Já tem uma vida que minha vida é assim, então nunca me questionei de nada. Mas hoje, pela primeira vez, me perguntei que sina era essa a minha, de ter pais separados. Pais separados todo mundo tem, mas assim tão longe... O que me conforta, é saber que não sou a única. Vim com uma carioca, que deixou filho, neta e nora na Suíça. Achei engraçado porque eu deixei minha mãe, ela o filho mas a dor era a mesma. Dor de saudades. 

Fiquei me perguntando quantas famílias eram assim, separadas por oceanos. E me dei conta que elas são necessárias, é tal globalização. A gente precisa de uma brasileira em Genève para mostrar para os gringos o que é uma feijoada, a gente precisa de um suíço para inventar fondue em Garanhuns. O que seria de Carlos sem a Fräulein Elza? Do Stand Center sem os coreanos? Bem que o mundo poderia ser ainda uma pangea, para gente não ter que ser separar. Mas não é, tinha que ter o mar, para nos separar! Me conforta pensar que mesmo se fosse ainda um continente só, o homem iria se mudar, é da natureza dele. O oceano só fez botar a pulga atrás da orelha do Américo, do Cristovão, de tantos e tantos, que pagaram para ver, tiveram a curiosidade em desvendar aqueles mistérios todos. E deve ser por isso que o oceano é salgado, pelas lágrimas de quem foi e quem ficou. Oh, Portugal!


segunda-feira, 21 de abril de 2008

She doesn't live here anymore


O Fantástico, na Suíça, é exibido às segundas. Acabei de ver a matéria com o pai e a madrasta da Isabella Nardoni. O que mais me impressiona neste caso agora não é mais a brutalidade da morte, mas sim a vida da menina. 

Desde o dia 29 que minha mãe, meu pai, meu tio, meu irmão, o Brasil e quiçá o mundo conhece esta menina: já vimos todas suas fotos, descobrimos como chamava seu tio, sua escola, sua família, as circunstâncias em que veio ao mundo. Descobrimos que ela era uma menina doce, carinhosa e obediente e que tinha um quarto lilás, com um baú da Hello Kitty e que o tema do seu próximo aniversário seria as princesas da Disney. Descobrimos que ela era muito sorridente e encantava a todos, gostava de macarrão e salada de alface. De repente, esta menina se tornou uma velha conhecida. Sua vida e seus gostos ficaram famosos tal e qual se ela tivesse saído do Big Brother. Os detalhes de sua vida são tão fascinantes como se ela fosse uma celebridade que nos conquistou instantaneamente. Passamos, todos nós, a amar- de um jeito ou de outro- esta menina, que, morta, acabara de entrar em nossas vidas. 

Isabella passa a ser a filha da nossa vizinha, a amiguinha do sobrinho, aquela menina que pega o mesmo transporte com o nosso filho. Ela agora toma corpo e ganha vida na nossa rotina. Parece, a cada instante, ser real, tamanha a freqüência que entra em nossas casas. E o mais estranho em conhecer cada vez mais Isabella é saber que nunca a conheceremos. E que ela, que parece tanto estar viva entre nós, aquela menina logo ali, infelizmente, não está mais lá. 

domingo, 20 de abril de 2008

Quando não dá para errar o país

Não é preciso nem ver o passaporte para entender que o país está errado

Há muitos anos, uma moça que era amiga da minha família foi à Espanha se prostituir. Voltou para o Brasil deportada, muito antes desta confusão toda. Na época, ela me disse que, uma vez no exterior, nunca confie em brasileiros. Não sei por quê, mas eu não só registrei a informação e passei a levar a sério. 

Muitos anos depois foi a minha vez de ir ao exterior. Não, não me prostitui, mas confiei em brasileiros. Fui explorada, humilhada, passada para trás. Claro que isso foi uma única vez, mas passei a ter um certo repúdio preconceituoso a todos que moram fora do Brasil. Brasileiro, para mim, só no Brasil. E é por isso que eu sempre me irrito profundamente quando estou fora do país e brasileiro entra na conversa sem ser chamado. Estes dias, no ônibus, dois brasileiros interromperam minha explicação geográfica sobre o Brasil para dizer que nevava no Sul, do mesmo jeito que neva aqui. Fiquei irritadíssima, claro. Não é porque você entende o que se está dizendo que dará opiniões. No Brasil, se você estas a falar de um assunto, o outro ouve e se cala (normalmente, porque já vi um menino discutir futebol com a Joanna).

Mas ontem não. Tudo porque, pela primeira vez, um brasileiro puxou conversa e falou algo útil. Pela primeira vez! Estava indo ao encontro de uma amiga para fazer compras na rue du Rhône quando ela me ligou para confirmar o encontro. O homem que estava do meu lado falou que o que não faltava em Genève era brasileiro. Não faltava mesmo. E começou a falar do Brasil. A parte mais interessante está a seguir:

-  Amo o Brasil, mas quero viver em Genève por muitos e muitos anos. Mas não sei se vou conseguir viver lá de novo. Passei um mês de férias; no vigésimo dia já queria voltar. 
- Por quê?
- São tantas coisas, todas pequenas, mas que fazem a diferença. Adoro comer salmão, tomar o meu vinho... quando que conseguiria comer salmão e tomar vinho todo dia no Brasil?
- Não sei, talvez nunca. 
- Mas o que mais me incomoda é a falta de educação. Aqui, se alguém esbarra em você já pede desculpas, lá, nem olha na sua cara. Quando cheguei no Brasil, o funcionário da Polícia Federal estava no vôo e já desceu para trabalhar. E desceu gritando: "Passaporte na mão, agora!".
- (...) 
- Se fosse aqui, seria "Bonjour Madames et Monsieurs. Prenez votre passaport, SVP. Merci de votre attencion". E assim que ouvi aquela gritaria toda disse para o meu amigo: "Nós não erramos de país, é o Brasil mesmo!". 

São estas e outras que fazem da pátria amada uma pátria inconfundível. Principalmente com a Suíça.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Dengue é coisa do passado?

Da Suíça:

- Eu já ouvi falar desta doença, dengue. Mas faz ela não tinha acabado? Faz tempo que não escuto falar dela, como é que o Brasil ainda tem uma doença desta?
- Porque é o Brasil, chèrie, respondeu minha mãe, a brasileira
- Ah tá. Brasil.

domingo, 13 de abril de 2008

Quando batida de carro é atração turística

Geneve, 2h30 da manhã. Um ruído alto acorda a vizinhança. Parece que foi batida de carro.

- Mãe, por que você está de casaco?
- Você não ouviu o barulho? Um estrondo! Acho que foi batida de carro. 

Sim, era mesmo uma batida de carro. Repare nos pensamentos de:

a) Meu padrasto, suíço: "Eu vim para ver se aconteceu alguma coisa e ligar pra ambulância". 

b) Minha mãe, brasileira: "Ai, vamos ver se na Suíça tem mesmo acidente de carro. As coisas aqui são tão perfeitas que parece ser mentira ter uma batida de carro!". 

Sem mais comentários. 

sábado, 12 de abril de 2008

No mercado da Suíça









Se a GAP fosse realmente tão fashion eles nem teriam contratado a Sarah Jessica Parker para passar esta mensagem cool. 





Na Cásper Líbero tinha uma aula chamada Cultura Brasileira, que eu não fiz porque não estudei publicidade. Eu assisti a alguma destas aulas quando tinha trabalho de algum amigo- e só. Mas eu queria ter feito para entender algumas coisas, tipo a glamurização que o brasileiro faz de coisas que não são para ser glamurizadas, tipo roupas da GAP, água Evian, enfim, coisas que são comuns em seus países mas ganham destaque de chique, cool e qualquer outro status do gênero no Brasil.

Hoje, no mercado no bairro de Meyrin (leia-se periferia de Geneve), estava olhando a variedade de queijos, suíços, claro. Perguntei para o meu padrasto quais ali eram os melhores, os mais chiques. "Chez Migro?!", com aquela cara de
"mas logo aqui?!". Pois é, não é porque você está na Suíça que vai comer o melhor queijo do mundo. Mas quando se fala naquela longínqua terra chamada Brasil que se está na Suíça, se pensa logo que está comendo os melhores queijos do planeta. E, se der uma olhadinha na gôndola do mercado, qualquer queijo que aqui custe 1 franco, lá vai custar uns 50 reais e quem levar vai fazer aquela cara de "como eu sou chique".

A água Evian, por exemplo, custou-me hoje 4 francos um pacote com garrafas. A questão não é o quanto custa no Brasil, mas o valor que se dá a ela. Meu padrasto, suíço nato, fez uma cara de "ah, esta água ai vem da montanha ali da esquina", em resumo, é água da bica. Mas da Suíça, o que não sei por quê, faz toda a diferença.

Idem para GAP. A minha irmã caçula ainda está na escola e diz que lá, naquela realidade a parte, usar GAP é o que há. Dior? Chanel? Que nada! O negócio é GAP (pelo menos na escola dela). Não sei se as pessoas sabem disso, mas a GAP é uma marca peba, de pobre mesmo nos Estados Unidos. Era a única marca que eu poderia comprar com meu minguado salário de 150 dólares por semana e mesmo assim eu não consigo entender como alguém pode se achar usando GAP! GAP!

E por quê? Por quê a Gap e a água Evian são tão cool no Brasil? Como é que elas viraram isso lá, será que foi campanha de marketing? Mensagem Subliminar? E é nestas horas que eu penso que publicitário é igual a Deus, que consegue transformar lixo em luxo assim como a água vira vinho...

terça-feira, 8 de abril de 2008

Quando a vida não tem respostas

Eu não consigo parar de pensar no caso da menina Isabella: o que aconteceu com a menina? Foi mesmo o pai que jogou a menina? Não consigo parar de fazer perguntas e claro que não tenho respostas. E ai me lembro de todos estes casos sem respostas ou que são tão mal contados que não se tem idéia de quem é o assassino. Algo na linha do Escaravelho do Diabo, mas com um final que nunca chega. Vale tanto para rua Cuba, quanto para a menina Ana Lidia, o caso Madelleine, que ninguém neste mundo inteiro trouxe uma resposta... Minha mãe diz que isso é coisa de E.T. Não sei se é do E.T. ou do Coisa-Ruim, só sei que não tem resposta.

E aí que me dei conta que os seres humanos não gostam de perguntas sem respostas, mistério só funciona para animais irracionais. Só isso para explicar esta busca maluca por respostas no caso da menina, para saber por que o céu é azul e até para entender por que o urso gosta de mel. Que diferença faz pra gente o urso gostar de mel? Pra que o ser humano foi pesquisar isso? Pra achar uma resposta pra dar pras crianças que perguntarem porque o Puff é obcecado por mel? Well, I don't think so. Pesquisamos estas e outras coisas do gênero simplesmente para ter respostas prontas. Talvez por que não gostamos de pensar para responder.