quarta-feira, 10 de março de 2010

Há vagas



Será que ele está decupando a sonora do entrevistado?


Cena 1. Pauta no hospício. Dia. Int. REPÓRTER e FOTÓGRAFA vão ao hospício fazer matéria sobre as condições reais da instituição. Como agora todas as redações são multimídia, o REPÓRTER escreve, grava podcast e ainda passagem para a matéria do site enquanto a FOTÓGRAFA filma tudo. Muito nervoso, o REPÓRTER erra a passagem 29 vezes (isso mesmo, 29). Loucos que estão internados no hospício decoram a passagem e começam a repetir para o REPÓRTER, que fica mais nervoso ainda.

REPÓRTER(para os loucos): Vocês estão me desconcertando e me afrontando, vocês são loucos mesmo, por isso estão no hospício. Olha para mim, eu to aqui solto na rua.

Loucos riem desvaidaradamente. FOTÓGRAFA fica constrangida. DIRETOR DA INSTITUIÇÃO tenta um diálogo com ela.

DIRETOR DA INSTITUIÇÃO: Ele é sempre assim?

FOTÓGRAFA: É. Às vezes é pior. Teve uma vez que ele entrevistou o Gilmar Mendes achando que era o Henrique Meirelles e fez perguntas sobre o Banco Central no meio de uma coletiva.

DIRETOR DA INSTITUIÇÃO: Nossa, o caso é mais grave do que eu tinha pensado. Achei que era loucura no grau 1, mas pela sua descrição, ele deve ser louco de grau 2 (e observa o REPÓRTER, que agora pula e grita). Olhe, tome aqui o meu cartão. Dê para família dele e diga que temos vagas e condições plenas de trata-lo.

FOTÓGRAFA (completamente sem graça): Ah, obrigada doutor. Mas se eu levar para família dele, vou ter que levar para a família de metade da redação e ai depois eu vou ter que fazer matéria aqui de superlotação.

DIRETOR DA INSTITUIÇÃO não entende o que a FOTÓGRAFA disse: será que metade dos jornalistas da redação dela precisa de tratamento? Qual o tipo de patologia? Ele não consegue esconder que, como bom cientista, ficou extremamente curioso para estudar esta amostra social.

DIRETOR DA INSTITUIÇÃO: Como quiser...

FOTÓGRAFA sai para fumar um cigarro, REPÓRTER continua gritando, loucos rindo e DIRETOR DA INSTITUIÇÃO observa curioso a cena. Fade out.

Este roteiro da vida real NÃO é ficção. Para preservar a identidade dos profissionais, eu apenas troquei a mídia e o gênero dos envolvidos.

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